MUSEU 100 OBRAS

À hora que escrevo estas linhas decorre, na cidade da Maia, uma homenagem ao Mestre Adelino Ângelo que, no dia de ontem, 08 de Novembro, completou 88 anos de vida.

O Mestre Adelino Ângelo nasceu no Solar de Lamas, no centro de Vieira do Minho, edificado de traça nobre que, nos anos 90 do século passado, foi adquirido pelo Município de Vieira do Minho para aí funcionar um Centro Cultural, uma atitude acertada da edilidade da altura, presidida pelo Engº Manuel Travessa de Matos, quando o edifício se preparava para ser adquirido por um privado.

Assim, veio o Município a valorizar este equipamento público, com obras de recuperação consideráveis, ao qual foi anexado o Auditório Municipal de Vieira do Minho, formando um pólo cultural de relevância numa terra carente desta vertente, sendo que todo o edificado deixou de estar associado à ilustre família de Lamas, que recebeu o valor do negócio, passando para a esfera pública, portanto, um espaço público que nos pertence a todos nós vieirenses.

Adelino Ângelo, ilustre vieirense, conhecido por expressar nas telas o seu imaginário “impressionista”, cedo se tornou conhecido no mundo da pintura, sendo reconhecido o seu talento a nível internacional, mas, permitam-me a opinião, ignorado na sua terra natal, de onde saiu cedo para ir viver com os avós em Guimarães, cidade onde estudou e iniciou a sua carreira artística.

Foi vontade do Mestre Adelino Ângelo ter um espaço museológico na sua terra, com parte das suas obras, pelo que todos recordaremos o equipamento que o próprio construiu nas Cerdeirinhas para esse efeito, entretanto, vendido e onde funciona há alguns anos um restaurante que aproveitou o nome de “museu”.

Depois de concluídas as obras de requalificação do Solar de Lamas, com recurso a financiamentos públicos, inaugurado que foi o espaço, veio a albergar algumas obras do Mestre, contudo, teremos de recuar ao dia 17 de Julho de 2011, data em que foi celebrado o contrato de cedência e utilização precária daquele equipamento público municipal, pela “Fundação” Mestre Adelino Ângelo, para ali funcionar um espaço museológico na designada Galeria nº1, e utilização do salão nobre da casa, local onde foi exposto um auto-retrato do Mestre pintor. Com este protocolo, válido por um período de 50 anos, renovável,  ficou convencionado que, doravante, o Centro Cultural designar-se-ia por CASA MUSEU ADELINO ÂNGELO.

Relevante dar agora conta que daquele contrato constava, logo na terceira cláusula, que “a parte do imóvel cedida destina-se exclusivamente ao desenvolvimento das actividades da FUNDAÇÃO MESTRE ADELINO ÂNGELO, designadamente, à dinamização e exposição do acervo pictórico do Mestre, constituído em cada momento por quadros em número nunca inferior a vinte (20) obras, de colóquios e de encontros, de projectos de investigação e a divulgação de exposições e outras iniciativas culturais”.

Percebe-se que, no mínimo, aquela galeria de arte, que ocupa a primeira sala do primeiro piso, tinha de “manter a quantidade mínima de vinte obras”, sendo que na mesma data foi declarado pelos responsáveis da “Fundação” comprometerem-se a “doar uma obra da sua autoria, por ano, à Câmara Municipal de Vieira do Minho”, sendo que até à presente data lhe são devidas 9 obras – período 2011 a 2019, pois estamos já no fim do ano – passando a ser propriedade pública, o que até ao presente momento nunca ocorreu.

No decurso do tempo, verificou-se que houve incumprimentos vários daquele contrato, sendo notória a falta de diálogo entre o Município de Vieira do Minho e aquela “Fundação”, surgindo então a ideia, cuja mentora foi a Drª Antonieta Dias, de criar-se uma Associação de Amigos do Museu, tendo-me dada conta desta iniciativa num encontro em Lisboa, no início do ano de 2018, tendo-me agradado a ideia, por forma a ajudar nas conversações entre as partes, de forma totalmente independente e apartidária, numa iniciativa de cidadania em defesa da obra do Mestre Adelino Ângelo e da manutenção de parte do seu espólio no Solar de Lamas, onde nasceu, como era seu desejo.

Depois de encetados vários encontros e contactos, em 25 de Junho de 2018, na Conservatória do Registo Comercial de Braga, foi constituída a Associação “PALETARTE – Os Amigos da Casa Museu Adelino Ângelo, Associação de Desenvolvimento Cultural”, sendo fundadores o Dr José Adelino Silva, sobrinho do Mestre, o professor José Marques Fernandes, e eu próprio, estabelecendo como fim, conforme prevê do Artigo 2º do Acto Constitutivo e Estatutos, “promover e proteger a Casa Museu Adelino Ângelo: promover, proteger e divulgar a obra integral do Mestre Adelino Ângelo, bem como, dar a conhecer o percurso da vida do Homem que está por detrás do Artista, através de exposições itinerantes das suas pinturas, quer no país, quer no estrangeiro, realizar colóquios sobre a Pintura, integrando-a noutras formas de Arte e/ou, noutras acções culturais, colaborar com outras instituições culturais, estabelecendo parcerias de relevo que, de todas as formas, deem prossecução aos objectivos supra referidos

Em 17 de Setembro de 2018, nas instalações gentilmente cedidas pela Junta de Freguesia de Vieira do Minho, reuniu pela primeira vez, em Assembleia Geral, a Associação PaletArte, sendo então eleitos para os órgãos sociais os sócios que aceitaram o repto, unindo-se a este projecto de boas intenções que foi comungado de boa fé por todos nós, iniciando actividade a direcção então eleita, presidida pela Drª Antonieta Dias, que ao longo do presente mandato têm cumprido, escrupulosamente, com o plano de actividades, sendo que o primeiro acto foi, precisamente, apresentar cumprimentos junto da edilidade municipal, a quem foi dada conta das boas intenções e fins da Associação PaletArte.

Aqui chegados, importa ainda dizer que foram envidados todos os esforços no sentido da instalação de um verdadeiro Museu na Casa Municipal da Cultura, ou seja, no Solar de Lamas, sendo entendimento da Associação PaletArte, inicialmente, também aceite pelo Mestre Adelino Ângelo, que todo o primeiro piso do edifício do Solar de Lamas fosse destinado à exposição de obras do Mestre, quanto a mim, a cedência de CEM obras de diferentes tipologias, seria o ideal, agora, um museu SEM obras, não tem qualquer sentido, daí, o título escolhido para este artigo de opinião, que só me vincula a mim e não os restantes companheiros da PaletArte!

Presentemente, as pinturas do Mestre foram retiradas da galeria 1, sendo substituídas por desenhos, alegadamente, porque estavam deterioradas (?) e a necessitar de urgente restauro (?), tendo sido, tudo quanto sei, uma decisão unilateral da “Fundação” que, afinal, não existe verdadeiramente, pois, o pedido de reconhecimento  da “Fundação Mestre Adelino Ângelo” foi indeferido através do Despacho nº8467/2016 do Gabinete da Ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, portanto, não tem qualquer personalidade jurídica, que é o mesmo que dizer, não existe qualquer Fundação!

Parece-me, francamente, que as duas partes andaram a empurrar o problema para a frente com a barriga, sendo certo que antes de surgir a possibilidade do espólio do Mestre Adelino Ângelo ser deslocalizado para uma Galeria em Paris, a vontade do Mestre pintor era, precisamente, deixar parte do seu acervo de arte na casa onde nasceu, que foi pertencente aos seus antepassados, à qual o ligam laços de sangue muito fortes, e que têm condições de dignidade para albergar obras, mas, presentemente, há um nítido conflito de interesses que não importa aqui realçar, o tempo se encarregará de dar a resposta certa a esta nova realidade que, de certa forma, vem hipotecar a possibilidade de ter um verdadeiro Museu de Pintura em Vieira do Minho.

Sou de opinião que se perdeu uma grande oportunidade de rever o protocolo estabelecido em Julho de 2011, para além dos contributos recentes da Associação PaletArte, com sugestões e reuniões tendentes à assinatura de um novo protocolo entre o Município, dono do Solar, e o Mestre Adelino Ângelo e a sua mulher, dono das obras de arte, o certo é que nada há de concreto, como se diz acima, a resolução definitiva do assunto tem sido “empurrado para a frente”, com iniciativas e exigências dilatórias.

Diz o povo, e é verdade, que “a água não passa duas vezes debaixo da mesma ponte”, e a primeira grande oportunidade de dotar a Casa Museu com obras próprias, doadas pelo Mestre Adelino Ângelo, ocorreu em Maio de 2015 quando, através de e-mail enviado para o endereço oficial do Município de Vieira do Minho – geral@cm-vminho.pt, foi remetido ao executivo municipal um projecto de minuta  de escritura de DOAÇÃO de “50 telas a óleo e 20 desenhos”, números que sempre poderiam ter sido negociados, e não foram, tudo quanto sei, nem resposta houve, talvez por desinteresse, digo eu!

Finalmente, importa realçar que a direcção da Associação PaletArte, presidida agora pelo Professor José Marques Fernandes, mantêm-se fiel à defesa dos seus princípios, cumprindo escrupulosamente o programa aprovado, com iniciativas muito louváveis junto da comunidade escolar de Vieira do Minho, e não só, pois, ainda na passada Quarta-feira se deslocou a Guimarães, e eu acompanhei os elementos da direcção, à Escola Secundária Francisco de Holanda, estabelecimento de ensino público de referência, onde o Mestre estudou e leccionou, tendo ali 16 obras suas, do início da sua carreira artística, devidamente conservadas, algumas das quais estão expostas em local de destaque daquela escola. Com esta iniciativa, para além de nos inteirarmos do estado das obras do Mestre, que se julgavam esquecidas em “algum sótão”, foram dados os primeiros passos tendentes a um encontro do Mestre Adelino Mestre com aquela comunidade educativa em momento próximo oportuno, pelo que, apenas faltou organizar a festa de aniversário do Mestre na Casa da Cultura à qual deu nome, como de resto aconteceu no ano passado, mas tal não foi possível uma vez ter sido organizado para a mesma data, o dia de hoje, uma homenagem ao Mestre Adelino Ângelo, pelo Institut du Monde Lusophone, de Paris, não restando dúvidas que está a ganhar terreno a “emigração” das obras do Mestre pintor vieirense para França, num nítido conflito de interesses que já não me cabe a mim ajuizar, contudo, como muita pena minha, estou certo que perdeu-se uma grande oportunidade de colocar Vieira do Minho no mapa da cultura portuguesa, como foi vontade do pintor vieirense, e alguém terá de explicar muito bem estes contornos aos Vieirenses, afinal, o que foi feito para evitar esta perda cultural?

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